terça-feira, 2 de março de 2010

Relato: Cine Olido e Hitchcock

Os incríveis filmes do grande gênio de suspense, Alfred Hitchcock, foram postos à mostra ao custo de 1 real na Galeria Olido. Curiosamente, essa amostra de filmes aconteceu exatamente no mesmo mês (fevereiro) que me ocorreu a seguinte frase: a vida é muito curta e eu quero conhecer bem um diretor de cinema.

O eleito foi o Hitchcock, depois de comprar e ver “Um corpo que cai (Vertigo)”. Fiquei deveras encantada com o filme, mas não consegui elaborar nada mais esperto para comentar aqui do que o post passado.

Porém, no dia 20 de fevereiro, tomadas por um nobre sentimento, fomos, Camila Brandão e eu, passar a tarde no Cine Olido.

Do fundo de nossa ignorância e contradizendo o preço do ingresso, achamos que a sala de cinema fosse estar vazia. Chegamos atrasadas para a primeira sessão, mas a tempo para descobrir em “Lifeboat (Um barco e nove destinos)”, um filme de 1944, que com uma fotografia precisa e simples e roteiro bem escrito (baseado em história de John Steinbeck) é possível fazer um filme surpreendente. E, a sala estava cheia...

Cheia de pessoas estranhas, assim como nós, e ninguém parecia ter vindo do mesmo lugar e muito menos partilhávamos de um senso comum. O que, claro, deixou a situação muito mais interessante.

A primeira frase que escutei ao entrar na sala para assistir a segunda sessão, “Frenesi” um filme de 1972, foi “É, filme velho... vieram ver um filme velho... tudo velho”,dita inúmeras vezes por um senhor desacompanhado, localizado na fileira atrás da nossa, para que todos escutassem. Já mais contido, o homem na fileira da frente, murmurava para si mesmo todas as suas angústias, enquanto um grupinho de jovens animados, falavam freneticamente qualquer coisa fora do contexto apresentado pelos dois homens, senhora com um rabo de cavalo pro lado e maquiagem borrrada que acabara de entrar e um moço que estava procurando um lugar para sentar desde a sessão passada.

Do fundo da minha compreensão de comportamento com o semelhante e otimismo ingênuo, eu realmente acreditei que nada poderia ficar mais estranho que aquele breve e único momento de histeria coletiva individual.

O filme considerado o mais violento de Hitchcock, com roteiro baseado no livro de Arthur La Bern, sobre um assassino em série que mata suas vítimas com um nó, nada tradicional, de gravata. É um filme de suspense, mas tem algumas partes pontuais onde o humor se encontra presente, igualmente de forma nada tradicional.

Eu repito a minha opinião: humor em partes pontuais, não o filme todo, mas partes pontuais.

Tal opinião era única e exclusiva minha, da Camila e talvez do moço das angústias, que falou bem alto que todo mundo que estava ali era doente e doido e foi embora depois de um ataque de risada de quase todos que assistiam à cena de uma mulher ser enforcada com a gravata e ficar de língua de fora, ainda no começo do filme. A partir deste momento, foram risadas fora de cena e fora do tempo, risadas dentro do contexto e muitas expressões de espanto da Camila e minha, perante tal situação.
Enquanto eu ameaçava me esconder atrás das mãos, o grupo de jovens animados ria sem parar. E, todo esse descompasso de senso comum e senso de humor, fizeram com que a Camila e eu nos questionássemos: era pra ser engraçado?
Entretanto, convictas de que não, de que as partes engraçadas eram pontuais mesmo, continuamos com a conduta de reação ao filme considerada apropriada por nós mesmas, destoando do resto da sala.

O único momento que as pessoas não riram fora do meu tempo foi justamente na cena que eu mais gostei do filme que consiste em movimento de câmera que mostra uma vítima entrar no apartamento com o assassino e se distancia da cena do crime descendo as escadas (de costas) até sair do edifício e além do vento, escutamos os gritos da vítima no fundo. É uma cena muito bem elaborada.


A cena mais bonita de "Frenesi"

Ao sair da sala de cinema, a única conclusão que Camila e eu conseguimos chegar foi que não gostamos do Tarantino. E, eu lembrei de quando fui ver “Bastardos Inglórios” e eu não compartilhava do mesmo senso de humor de todas as pessoas que acharam o filme muito bom e riram. Até então, eu só tinha me assustado fora do tempo quando assisti “Vanilla Sky” há muito tempo atrás e fui a única a gritar na sala de cinema, antecipando a cena que estava por vir.

Mas, nada chega perto da situação em que assisti “Frenesi” na Galeria Olido.

E, essa situação ficou na minha cabeça, “Por que raios todo mundo achou engraçado?”, “O que foi aquilo?”, “Foi de verdade?”. Cheguei até a colocar culpa no preço dos ingressos e dizer que ninguém lá sabia quem era o Hitchcock.

Mas, a melhor explicação é revelada no próprio nome do filme: Frenesi. Delírio, atividade sucessiva, entusiasmo delirante.

E está tudo certo finalmente.



Filmes assistidos:
1. Lifeboat, 1944
2. Frenesi, 1972
3. Trama Macabra (Family Plot), 1976, último filme do Hitchcock (extraordinário!)

3 comentários:

Unknown disse...

Ri muito mais lendo o seu post do aquele povo sem noção assistindo um suspense com cenas de humor PONTUAIS!!!!!

Tenho Ladrão de Casaca para colaborar com o seu estudo de caso: Hitchcock.

Mina Hugerth disse...

Nossa, mas risada nervosa no cinema é a coisa mais comum que tem!

Desde risadas fofas e histéricas em Onde Vivem os Monstros, até risadas agoniadas e histéricas em Império dos Sonhos, sempre reparo nisso.

E nunca rio.

Unknown disse...

Imagine risadas de alguém que ache o Jim carrey hilário vendo o próprio fazendo palhaçada na tela do cinema. Não pode em hipótese alguma rir dessa maneira num momento tenso de um filme do Hitchcock!