domingo, 25 de abril de 2010

Profissão (divagações #312)


Vim percebendo algumas coisas estes últimos tempos. Sobre como nos afirmamos em papeis. Agora que me formei, vi em mim, as frases “sou estudante”, “acabei de me formar em arquitetura”, “sou arquiteta”, “sou cenógrafa” evoluírem com rapidez espantosa, mas talvez afirmações necessárias para eu tentar afirmar o papel que quero preencher agora.

Não que eu me ache nenhum tipo de expert no assunto, mas sei que o nosso discurso sobre nós mesmos muda como nos percebemos e como o mundo nos percebe. Se eu falar que sou Napoleão, não vai colar; mas se eu falar que sou quem sou ou quem quero ser, e fizer por merecer, a validação minha e do outro pode ajudar nessa concretização.


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Percebi também como assumimos papeis nos grupos em que estamos inseridos. Como num grupo de amigos você pode ser o engraçado, o que ouve... E em cada grupo você pode desempenhar um papel muito distinto.

Ao mesmo tempo, em grupos profissionais isso também acontece, como conversei com a Taissa esses dias. Dependendo da dinâmica criada você se torna o neurótico, o executivo, o desencanado... E só com o preenchimento de todos esses papeis a dinâmica de trabalho consegue fluir.
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Aprendi isso vendo quando dá certo e especialmente quando dá errado.

O que fazer quando a dinâmica de um grupo não flui?
Mudar o seu papel? Fazer o outro mudar o dele? Com um discurso otimista ou uma verdade nua e crua?
Ou será que se deve assumir um papel que pode não ser prazeroso, ou gerar sorrisos amigos, mas essencial pra que as coisas funcionem?
Quando que temos que ser atores? Ator de sorrir mesmo estando infeliz, ator de criar uma figura de autoridade mesmo quando não nos sentimos capazes?
Quando que podemos desabafar? Como saber como as coisas vão ecoar nos outros, se você vai criar aliados ou um bocado de pessoas que te acham um chato?

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Mas pra acabar com uma nota menos duvidosa e mais positiva, quando se assume um papel em que a carapuça serve, que você exerce bem, que os outros reconhecem com bem feito e a companhia é bem vinda, quando todas as peças se encaixam, a sensação é sensacional.

Eu sei que nós putz-escritoras e a maioria dos nossos leitores, estamos nessa etapa de achar o papel que sabemos desempenhar o melhor possível. Merda pra nós!

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Parabéns (?) Brasília

Texto enviado especialmente pela Camila para a comemoração dos cinquenta anos de Brasília! Muito bom!



Há 50 anos surgiu uma nova cidade, uma capital. Carregada de significados e desejos de uma nova sociedade, Brasília se instalou no meio do cerrado, cercada de nada. Algo teria, necessariamente, que vir até ela. E vieram muitos algos, muitos alguéns. Brasília então começou a surgir como espaço construído e como sociedade, para poder rápida e finalmente ser inaugurada como cidade.


Mas o que de fato surgiu, e como evoluiu e se estabeleceu no meio do território brasileiro? Essa cidade consegue ser a representação de um povo e de sua cultura? A sociedade almejada por seus criadores chegou até aquele local assinalado com um sinal da cruz?

Visitar Brasília é uma experiência única. Maravilha-se com a grandiosidade do Eixo Monumental e com a suposta generosidade dos espaços criados nas Superquadras. Assusta-se com a dificuldade de uma simples travessia de ruas, na busca de uma faixa de pedestres. Fica-se abismado com a quantidade inimaginável de toldos que é possível colocar em um edifício com apenas 6 andares; o que torna bastante difícil a comunicação entre a mãe que está no apartamento e o filho que brinca no jardim. Mostra-se de uma dificuldade imensa o conhecimento dos pilotis tanto enaltecidos pela arquitetura moderna: hoje em dia os salões de festa se fazem extremamente necessários.

Em outra escala, pode-se pensar na riqueza cultural que uma nova cidade pode trazer a um país. Pessoas vindas de todas as partes de um território tão extenso, para construir e residir no que configura a nova cara do Brasil, mas para eles está reservada tão somente a construção.

Brasília trazia consigo o desenho de um novo espaço para uma nova sociedade, que ainda não havia sido estabelecida, mas que o futuro havia de trazer. Mal sabia Lúcio Costa que o futuro ainda vai demorar a chegar (sendo isso uma visão bastante otimista, pois pode ser que não chegue jamais). Uma cidade criada para uma população que se contenta em utilizar somente das suas unidades de vizinhança; que não necessita de transporte público para sua mobilidade diária; que pode contar com o desenvolvimento igualitário de um país que promete! Mal sabia...

Hoje Brasília consegue, infelizmente, ser o retrato da sociedade brasileira com um todo, da sua desigualdade tão gritante, independente da distância ou proximidade física. E da falta de tato daqueles que planejam não só o espaço, mas a vida daqueles que o ocupam. Pois é necessário planejamento, é necessária a continuidade de um pensamento, atrelado a uma visão concisa do todo. Uma capital jamais será a representação de um ideal de país que não existe. Faltou para o Brasil (e não para Brasília) que aqueles que determinaram o caminho que a política ia seguir lessem o memorial de Lucio Costa. E que, condizente com todo aquele discurso de uma cidade que “se caracteriza pela simplicidade e clareza do risco original, o que não exclui, conforme se viu, a variedade no tratamento das partes, cada qual concebida segundo a natureza peculiar da respectiva função, resultando daí a harmonia das exigências de aparência contraditória. É assim que, sendo monumental, é também cômoda, eficiente, acolhedora e íntima. É ao mesmo tempo derramada e concisa, bucólica e urbana, lírica e funcional”, buscasse um país que se caracterizasse tal qual (o projeto de) sua capital.

E é com esse descompasso existente entre parte e todo que o país deseja a seu centro representativo, um grande e sonoro Parabéns (?)!


segunda-feira, 5 de abril de 2010

Política (divagações #265)



Eu gosto de discutir política. Mas gosto do jeito que vale a pena. Como no futebol, e (is)pure bem disse, existe o jeito crítico de discutir, e existe o jeito de idéias cristalizadas e que não vão mudar; não há debate, há disputa de egos.

Então pra discutir política do jeito que me parece valer a pena, vamos lá.

Semana passada o Lula fez um discurso não me lembro pra quê, em que (apesar de poder ser punido pelo TSE por fazer campanha antes da hora), disse que “nós (Brasil, brasileiros, governo) estamos no meio da travessia de um rio, e que se dermos meia volta agora, corremos o risco de nos afogarmos”.

Achei bonita essa metáfora independente do significado político. Fiquei pensando sobre a imagem do rio, de que mesmo seguindo em frente, corremos o risco de nos afogarmos. E que pela conjuntura do Brasil no mundo hoje, parece que estamos mesmo na travessia de um rio, e que estamos em um momento propício e necessário para se discutir o rumo desta travessia.

Em palestra na exposição Modernista: 80 anos, Carlos Martins falou sobre o Brasil, o papel da cidade e do arquiteto, e lembrou que essa idéia de que somos países em desenvolvimento e que iremos chegar ao nível dos avançados, hoje já é sabidamente uma lenda, mas emendou e afirmou que hoje se sabe que nós é quem somos o futuros destes outros países.

O que ainda me dá agonia é que mesmo quando se pensa tudo isso, na maioria das vezes, continuamos presos num discurso vazio, sem aplicação prática.

Já se sabe há mais de década que os arquitetos produzem 5% do que é produzido no país. Só que mesmo tendo ouvido esta estatística mil vezes, nunca vi ela ser emendada por uma proposta.

E eu vou fazer a mesma coisa agora, porque também não sei que resposta se poderia dar. Mas em tempos de eleição, mudanças climáticas e final do campeonato paulista, dá vontade de ter uma.

A única coisa que eu tenho certeza, é que os tempos de cada um no seu quadrado fazendo uma coisa totalmente alheia à que o próximo está, já eram.



E aí está, mais uma declaração vazia sobre política, pra se juntar à pilha. Idéias que estruturam um começo e um fim, mas não tem o meio, a sustança. Vou lá no meu quadrado pensar sobre como sair dele e quando descobrir eu acrescento o miolo do bolo.